quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Brasil acima de tudo, Deus acima de todos*

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Foi com este mote que Jair Messias Bolsonaro se tornou, no dia 28 de outubro, o 38º Presidente (eleito) da República Federativa do Brasil. Ao contrário da nossa realidade, no Brasil ainda está muito vincado um sentimento de pertença por parte da esmagadora maioria da população a diversas denominações e isso, naturalmente, transborda para a realidade política. Bolsonaro soube aproveitar este facto de forma muito arguta, personalizando ao máximo a eleição, simplificando-a e tornando-a uma escolha entre a “Redenção” (ele) e o “Apocalipse” (Haddad/PT/Lula), numa clássica tática de polarização (ou nós ou o caos). Em termos de estratégia política tem tudo para ser, de facto, um case study, se não veja-se o percurso que o candidato começou a delinear desde o dia em que foi esfaqueado (quando andava na faixa dos 20% dos votos) até ao dia da 2ª volta (ou 2º turno como dizem os nossos irmãos brasileiros), em que obteve a maioria absoluta dos votos (55%). Foi, sem margem para dúvidas, um percurso em ascendente, alicerçado numa mensagem simples (combate à insegurança e à corrupção e, por conseguinte, ao enriquecimento ilícito), plasmada aliás no título do artigo, num alvo bem definido (o PT e os seus 14 anos de governação) e na figura de um profeta-mártir (o mito Messias Bolsonaro).
Após o atentado de Minas Gerais houve, aliás, uma bem-sucedida moderação do discurso do candidato, aparecendo este com uma postura de humildade, quiçá até candura, e demonstrando uma fragilidade/humanidade até aí desconhecida e que terá apelado de forma decisiva a uma grande parte do eleitorado ainda indeciso. Foi, creio, o turning point de uma campanha de um candidato de franjas para uma campanha de um candidato com reais hipóteses de vencer não só a 1ª volta, como já se previa desde há algum tempo, mas também a 2ª volta, como veio efetivamente a suceder.
A partir desse momento, e estando em vantagem, foi uma questão de deixar o tempo correr, pois tornou-se evidente que o candidato do PT estava perante uma montanha impossível de escalar, o que explica a tentativa de Haddad forçar Bolsonaro a debater, fazendo-o sair da sua zona de conforto, o que este, ardilosamente, diga-se de passagem, evitou, pois estando em vantagem nada teria a ganhar em expor-se num campo onde o adversário seria previsivelmente mais forte. De ser um candidato incauto ninguém poderá acusar Bolsonaro, tendo seguido muito bem a velha máxima de esconder os defeitos e realçar as virtudes, como qualquer político que se digne deve fazer…
Não fugiremos à verdade se dissermos que o discurso de Bolsonaro tem alguns laivos populistas, embora com nuances  de um pragmatismo porventura inesperado, vindo de um candidato que se diz ser despreparado, como será a escolha de Paulo Guedes (reputado economista e seguidor da linha da Escola de Chicago) para Ministro das Finanças e Economia e, sobretudo, do Juiz Federal Sérgio Moro para Ministro da Justiça, numa notória e inusitada tentativa de marcar um claro contraste com a governação anterior, tentando introduzir um elemento “meritocrático” na escolha dos novos membros do Governo, o que é de salutar, note-se.
Relativamente às preocupações generalizadas quanto a possíveis pulsões ou derivas antidemocráticas do agora Presidente-eleito, nomeadamente à esquerda, com a colagem de epítetos como ditador ou fascista, basta atentar no discurso de Bolsonaro para perceber que, por agora, o novo Chefe de Estado brasileiro dá sinais de uma certa inversão de marcha e normalização/conformação aos trâmites democráticos vigentes, o que vem provar, mais uma vez, que as campanhas personalizadas como são as presidenciais, tendem sempre a extremar o discurso em período eleitoral para depois, naturalmente, moderarem os excessos de linguagem e discurso na fase pós-eleitoral. É dos livros, como diria o notável Norberto Bobbio. Teremos, pois, de aguardar pelas primeiras medidas do Governo Bolsonaro, concedendo-lhe o benefício da dúvida, como devemos fazer a todos aqueles que são eleitos democraticamente, sem exceção, antes de, antecipada e precipitadamente, nos convertermos em arautos da desgraça, mormente em relação a um candidato que prometeu governar “seguindo os mandamentos de Deus”.
Os desafios para o novo Governo não são de somenos, constituindo a gritante falta de segurança (um número impressionante de mais de 60.000 assassinatos só em 2017!) e a corrupção os problemas mais prementes para Bolsonaro e o seu elenco governativo tomarem em mãos, o que não será fácil, pois muitas dessas medidas terão de ter o crivo de um Congresso muito fragmentado (onde 30 partidos terão assento parlamentar na Câmara dos Deputados e 21 no Senado!), exigindo maiorias qualificadas para a aprovação de leis que estarão ainda sujeitas a litigância perante o Supremo Tribunal Federal, com poderes para avaliar a constitucionalidade dos actos normativos. Se juntarmos a isto a necessidade de um “choque” para revitalizar a anémica economia do Brasil, então estamos a falar de uma tarefa de proporções dantescas. Perante tal cenário, fica mais fácil entender o porquê de o novo Presidente recorrer constantemente à inspiração divina, é que bem vai precisar Dela!
Em jeito de conclusão, esperemos que esta mudança de ciclo possa, sinceramente, significar o alcançar dos anseios do povo desse país-continente, riquíssimo em recursos naturais e com condições para se assumir como uma grande potência regional, com um papel muito relevante a desempenhar no Grande Concerto das Nações.
Se Deus, como se sói dizer por Terras de Vera-Cruz, for mesmo brasileiro, então há razões para estarmos cautelosamente otimistas, pois pior do que estava não pode mesmo ficar, estamos em crer. Alea jacta est…

* Lema de campanha da candidatura à Presidência da República de Jair Bolsonaro   

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Portugal 2050




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Ultimamente temos verificado, por parte de alguns titulares de cargos públicos ou equiparados, um exercício de funções sem a lisura que se exige, e por isso seria bom recordar as palavras, em tom de advertência, do Senhor Presidente da República no 5 de outubro passado: “são casos a mais de princípios vividos a menos”, isto como ponto de partida para a projeção do que poderá, ou melhor se me é permitida a audácia, deverá ser Portugal em 2050.

Partindo para essa prognose ousada, começaríamos certamente por elencar no topo das prioridades uma mudança no comportamento dos atores políticos no sentido de uma maior responsabilização das suas ações, a tão propalada accountability anglo-saxónica. Torna-se claro que essa maior responsabilização deverá vir acompanhada de uma maior retribuição em termos financeiros para quem transita no espaço público: não tenhamos ilusões, se queremos os melhores temos, enquanto coletividade, de proporcionar uma melhor remuneração aos servidores públicos. É um esforço que, não temos dúvidas, nos poupará milhões em perdas por gestões incompetentes, ou como se costuma dizer, há casos em que “o barato sai caro”. Esta medida poderá contribuir para uma diminuição significativa da corrupção e do compadrio no plano estatal e fechar de vez a porta giratória para outros negócios menos claros em que a atividade política se transformou. A regulação restritiva do lobby poderá ser outra medida importante, juntamente com a criação de um código de ética rígido para o exercício de funções públicas e com sanções penais, e não meramente políticas, em caso de violação.

Passando agora para um dos pilares fundamentais do Estado, a Educação, devemos dizer que há muito a fazer nesta importantíssima área. A premiação do mérito é uma delas. Ora o mérito só se afere de forma justa e equitativa através de uma avaliação rigorosa e regular dos conteúdos educativos. A ideia, veiculada por uns quantos, de que a eliminação dos exames nacionais promoveria uma maior igualdade entre os estudantes, não passa de um sofisma. Na verdade, isso significaria, em termos objetivos, a criação de um fosso maior entres as diferentes camadas populacionais, pois o Estado ficaria sem instrumentos de verificação eficazes que lhe permitissem alocar recursos para os distritos escolares com maiores dificuldades. A solução parece-nos ser o reforço da avaliação como forma de promover o esforço e consequentemente o mérito dos nossos jovens estudantes. Aqui, os hábitos de leitura são de suma importância, porque só uma leitura frequente permite desenvolver uma boa capacidade de raciocínio e de escrita, fundamental para a adequada formação dos jovens de hoje e quadros do amanhã.

No que toca à Saúde deve haver uma racionalização dos serviços, tendo em conta as realidades locais, isto sem pôr em causa o acesso dos cidadãos, e um dos aspetos em que esperamos chegar a 2050 com um cenário completamente diferente é o da atribuição de médicos de família às populações, ainda insuficiente, malogradamente. No que toca à liberdade de escolha ela deve ser acautelada sempre que possível, se bem que de forma proporcional, sobretudo para não criar assimetrias, o que vale igualmente para o setor educativo. Relativamente a políticas de saúde pública propriamente ditas, não esquecer o drama que vive a Saúde Mental, em que é necessário investir muito mais na criação de práticas de cuidados continuados, pois as mais das vezes há tendência a desvalorizar as doenças mentais, em que as pessoas sofrem num silêncio excruciante (veja-se, a titulo de exemplo, o caso da depressão) por ainda ser uma temática malvista socialmente e assunto tabu em muitas famílias.

No concernente à Segurança Social, a sua sustentabilidade está diretamente ligada à taxa de natalidade: o peso demográfico da população idosa constitui um dos desafios mais prementes para as gerações vindouras. Aqui o Estado deve ter um papel ativo na promoção de políticas natalistas, a nível fiscal, de licenças de maternidade e paternidade, atribuição de subsídios como forma de incentivo, etc. Quanto à reformulação do sistema, que parece evidente num futuro próximo, seria de ponderar, assim que possível, a introdução de um sistema misto em que o contribuinte descontasse parte dos seus rendimentos para uma espécie de conta própria, à qual poderia aceder no final da idade ativa, isto em conjugação com o sistema atual em que são os contribuintes a sustentar o Fundo de Pensões.

Não queríamos deixar de mencionar uma problemática muito atual, a da mobilidade urbana e suburbana. Sabemos que, devido à degradação geral e progressiva dos meios de transporte, os cidadãos têm cada vez menos opções para se deslocar nos seus movimentos pendulares, aumentando indesejavelmente o rácio de poluição por quilómetro quadrado nas grandes urbes, com consequências nefastas ainda por se manifestarem na saúde coletiva. Um dos caminhos, embora admitamos perfeitamente que esta visão não é unívoca, será o da privatização parcial dos transportes públicos. Existem setores em que o Estado, mais do que um facilitador, se poderá constituir antes num obstáculo ao livre desenvolvimento de plataformas inovadoras de transporte (tome-se como exemplo disso a Uber e o Cabify). Os cidadãos não querem falta de bilhetes nas estações e têm o direito de viajar com condições mínimas de conforto – pagam por isso, e não é pouco! Trazendo à colação o exemplo de Lisboa: não podemos aceitar a canibalização das composições do Metro, uma vez que isso coloca em causa a segurança dos utentes dos transportes. Por último, mas não menos importante, referir que as populações do interior merecem uma rede de transportes mais desenvolvida e regular no seu funcionamento e acesso.

Espero com este singelo exercício de cidadania ter contribuído para a reflexão do que poderá ser Portugal em 2050, um horizonte que vemos hoje com o otimismo da juventude, num país que já deu mundos ao Mundo e que tem quadros altamente qualificados nos mais variados domínios (desde a ciência, literatura, política, até ao desporto e ao mundo empresarial), sempre com a ideia de que, como escreveu o poeta, “falta cumprir-se Portugal”. E de facto, em abono da verdade, falta ainda cumprir-se muito Portugal. Por isso, caros jovens de Portugal, cumpramo-lo com força e vigor! Que assim seja, pois esta é a nossa Voz, a Voz dos Jovens!

(PS: não podia deixar de manifestar o nosso pesar pelo falecimento do Professor João Lobo Antunes, personalidade ímpar na sociedade portuguesa, pelo seu humanismo, cultura, inteligência, dignidade e excelência no exercício das suas funções, não só como médico, mas também como Presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e nos mais variados domínios – de recordar que é recipiente do Prémio Pessoa – e, sobretudo, pelo exemplo de vida encorajador que lega aos jovens do nosso País).

sábado, 23 de janeiro de 2016

O Voto Certo no Homem Certo

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O Professor Marcelo Rebelo de Sousa é, indubitavelmente, o homem de que Portugal precisa para nos guiar nestes tempos tumultuosos. É-o pela sua vasta experiência como Professor, jurisconsulto, político e, porque não, comentador atento à realidade nacional. Esteve na fundação do PPD/PSD, na Assembleia Constituinte, na criação do Expresso, no Governo, e até na Vice-Presidência do Partido Popular Europeu. Ao longo destes anos terá, naturalmente, alterado o seu posicionamento relativamente a algumas questões, pois também só os burros não mudam de opinião, como sabiamente diz o povo.

O Professor Marcelo possui, inquestionavelmente, a preparação, a sensibilidade e a experiência política para exercer com elevada competência a mais alta magistratura da nação. Não deixa de ser verdade que tem uma personalidade sui generis, de saudar nestes tempos de algum cinzentismo na política portuguesa, e que a meu ver constitui também o traço distintivo fundamental relativamente às outras candidaturas, algo formatadas nas suas ideias e métodos. Com certeza, e porque tal releva de ser humano como todos nós, não estará imune ao erro, mas será, porventura, de entre todos os candidatos, o que menos errará, daí ser o favorito à vitória nestas eleições.

Ao longo dos anos o Professor tem feito, e o que isto custa a tantos, um percurso de cidadania e isenção muito positivo, que lhe permite agora granjear o apoio de grande parte da população, e que tem levado alguns opositores, as mais das vezes, a caracterizá-lo como um homem volúvel e sem posições bem definidas sobre algumas matérias.

Discordo deste entendimento redutor, pois creio que o Professor Rebelo de Sousa tem, efetivamente, demonstrado as suas posições (para quem as quiser, realmente, auscultar) ao longo dos últimos quinze anos em horário nobre, disso não tendo, obviamente, culpa.

Se teve esse espaço foi devido à ressonância criada com os espectadores, pautando o seu percurso por uma postura de independência não fácil de assumir em Portugal, e que sem espanto lhe tem granjeado inimizades por onde passa, pois a inveja está sempre à espreita.

Temos a responsabilidade de, no próximo dia 24, quando nos deslocarmos à urna para depositar o nosso boletim de voto, pensar em quem está mais bem preparado para exercer o cargo, tantas vezes desvalorizado, mas, contudo, tão importante, sobretudo nos tempos hodiernos, de Presidente da República. Desta vez não nos vamos deixar enganar. Eu não tenho dúvidas em afirmar que, para mim, o voto certo é no homem certo, o cidadão Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa. 

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Tempos Presidenciais



No debate de hoje ficou claro, para os mais distraídos, o "despertar" para a política do candidato Sampaio da Nóvoa, após 40 e muitos anos de alheamento orgulhoso, diria eu. Tentou, porque assim era necessário, encostar Marcelo Rebelo de Sousa às cordas, com um argumentário já gasto relativamente a alegadas contradições no discurso do Professor. Pudera, pois quando se tem uma vida de intervenção cívico-política de escassos quatro anos, em comparação com os 40 e mais do seu oponente, torna-se tudo mais fácil. Não obstante, o Professor Marcelo demonstrou estar à altura do desafio, rechaçando com a sua habitual sagacidade os ataques despropositados do ´virginal` candidato a Presidente.
Assim, e no final de uma pré-campanha que se tem pautado por alguma monotonia, quiçá em virtude da sua colagem às legislativas, a única novidade (spoiler alert!), prende-se com o facto do maior adversário de Marcelo Rebelo de Sousa dar pelo nome de ABSTENÇÃO, o que de resto diz bem da qualidade da generalidade dos restantes candidatos, ainda que com honrosas exceções (Henrique Neto, Paulo Morais e até Marisa Matias). Contudo, continuo a acreditar convictamente que o Professor Marcelo “is the best man for the job” e, certamente, com todas as qualidades humanas e políticas que lhe são reconhecidas, dará um excelente Presidente da República.

PS: a ver se a campanha aquece na reta final porque este janeiro tem estado muito frio, chuvoso e deslustroso…

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Discurso da Tomada de Posse do Presidente do NEAFDL



Estamos aqui hoje para afirmar a vontade de uma impreterível mudança, que requer o empenho e a dedicação de todos os elementos do Núcleo de Estudantes Africanos da Faculdade de Direito de Lisboa (NEAFDL). Nestes tempos árduos e, concomitantemente, desafiantes em que vivemos, não nos podemos esquecer, em circunstância alguma, daqueles que mais carecem da nossa preciosa atenção e ajuda, os estudantes. São eles a razão última do nosso compromisso cívico-associativo, que abraçamos desde a primeira hora. 

Aqui nos têm também para continuar a celebrar a magnífica e rica história do NEAFDL, onde, com avanços e recuos, temos tentado levá-lo a bom porto.
Sem vós a nossa presença aqui, hoje, à frente desta nobre instituição, a que podemos chamar orgulhosamente de casa, seria desprovida de qualquer tipo de sentido. Razão pela qual convocamo-vos, sem excepção, os professores, os funcionários e os estudantes, para um novo caminho de dinamismo, inovação, esperança e progresso, que todos nós almejamos. 

Aos que chegaram e precisam de orientação e de uma palavra amiga, ela ser-vos-á dada, pois a união faz a força. 

Nesta sequência, temos o intuito de promover uma maior abertura do NEA para o exterior, bem como uma maior aceitação de estudantes africanos e afrodescendentes na associação académica, especialmente a integração destes nos órgãos supremos da Escola. Não nos esqueçamos que, antes das nossas origens, dos diferentes percursos de vida de cada um, das nossas idiossincrasias, há algo de fundamental que nos une e nos identifica – o vínculo da africanidade e da nossa alma mater, a Faculdade de Direito de Lisboa. 

No que concerne à realidade peculiar dos estudantes africanos e afrodescendentes da Faculdade, é hora de reflectir – seriamente – na desnecessidade de demorarem mais anos, geralmente, a acabar o curso, visto terem menos condições económicas, na sua esmagadora maioria, que os colegas. Muitos, infelizmente, não dispõem de qualquer tipo de apoio estatal ou familiar e são obrigados a trabalhar em condições extremamente precárias para sustentar-se e custear os estudos. Chega mesmo a existir casos de desistência do curso por razões económico-financeiras e, em certos casos, o não retorno à Faculdade.

Para dar a volta a esta premente situação, que urge combater, contamos com a compreensão e o bom senso dos órgãos dirigentes da Faculdade, nomeadamente na flexibilização dos planos de pagamento das propinas, que até então têm sido uma ferramenta útil e essencial para que muitos possam prosseguir os seus estudos. Da nossa parte, e com o grado apoio dos corpos dirigentes, assim continuará a ser, desde que cumpridos de forma responsável pelos alunos, obviamente. 

Apelamos, da mesma sorte, à compreensão da parte dos docentes, para o diferente ponto de partida dos que vêm para cá estudar, deslocados do seu país, da sua realidade, da sua parentela e dos seus amigos. A tolerância para com eles deve ser mais larga e o acompanhamento escolar mais estreito. 

Nestes tempos de insegurança, de incerteza, de inconformismo e de desânimo, ousemos falar e reivindicar. Tenhamos consciência não só dos direitos, mas também dos deveres e obrigações: ajudemos, apoiemos, questionemos, mas mais importante, saibamos escutar através do exemplo, da boa conduta e da acção. Façamo-nos respeitar, pois como dizia um velho provérbio africano – “se queres ir depressa vai sozinho, se queres ir longe, vai acompanhado.” Portanto, o tempo é de inclusão, não de exclusão. O tempo é de aceitação, não de rejeição, o tempo é de compreensão, não de intolerância, o tempo é de todos, e não de cada um. O tempo é nosso mas, acima de tudo, é vosso. 

Estamos cientes da responsabilidade que recai sobre nós, enquanto representantes de todos os estudantes africanos e afrodescendentes da Faculdade de Direito de Lisboa, pois, como tão bem um dia afirmou Churchill – “a diferença entre um demagogo e um estadista é que, enquanto o demagogo governa a pensar nas próximas eleições, o estadista governa a pensar nas próximas gerações”. 

Deixar, igualmente, uma palavra de apreço e agradecimento aos que, ao longo dos anos, têm contribuído para o desenvolvimento do Núcleo e, em particular, à Direção cessante, na pessoa da sua Presidente, Vânia Gentil, pelos esforços envidados na prossecução dos interesses dos nossos associados. Termino agora, pois mais do que hora de palavras, é hora de AÇÃO. 

A todos vós, e em nome do Núcleo de Estudantes Africanos, muito obrigado pela vossa presença. 

Viva o NEAFDL!

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Quo Vadis Portugal?



Analisando a situação social e política atual, estamos perante um momento de (in)definição em que cada um deve tomar uma posição e assumir as consequências dessa escolha.

No dia 4 de Outubro ocorreu em Portugal aquilo a que nos países anglo-saxónicos se convencionou chamar de “hung parliament”, ou seja, uma configuração parlamentar onde os partidos tradicionais de poder (o dito “arco da governação”) não lograram a obtenção de uma maioria absoluta que assegurasse a estabilidade governativa. Tal não constitui, no nosso sistema político, novidade, senão pelo facto de, desta vez, existir uma bipolarização quase perfeita entre esquerda e direita. Digo quase uma vez que, enquanto a direita constitui uma coligação programática coerente e coesa, tal já não sucede à esquerda do espectro partidário, provocando uma distorção nesta bipolarização que apesar de favorecer, numa primeira análise, a Coligação, na prática, e no caso da não obtenção de uma maioria absoluta por parte desta, a impede de formar Governo, em virtude da esquerda ter a maioria aritmética dos mandatos na Assembleia da República.

Embora essa maioria, por seu lado e por definição, não seja nem coerente, nem coesa e muito menos programática como a da Direita, por vicissitudes ou razões várias. Uma delas explica-se pelo “centralismo democrático” quer do Partido Comunista Português (mais “Verdes”), quer do Bloco de Esquerda, que possuem uma visão da esquerda bem diferente da do Partido Socialista, que se identifica como pertencendo à corrente do socialismo democrático por oposição ao socialismo, digamos, centralista propugnado por PCP e BE, em que se verifica uma estrutura vertical rígida de comité central, com pouco espaço para a dissensão interna.

E mais, em termos programáticos as diferenças só se acentuam visto que o PS é, para todos os efeitos, o partido português europeísta por excelência, tendo promovido fortemente a adesão de Portugal à então CEE, em 1986, tomando parte, direta ou indiretamente, na assinatura de todos os tratados europeus desde então. Já o Bloco e o PCP são visceralmente contra o Tratado Orçamental, contra a OTAN e contra o cumprimento dos compromissos internacionais do país. Isto cria uma situação em que o PS, por si só, é incapaz de se constituir como uma alternativa viável de Governo, visto que não consegue suplantar em votos o bloco de direita, tendo de se aliar, contra a sua própria natureza, à esquerda radical para poder formar Governo.

No atual conturbado xadrez político em que estamos envolvidos, isso significa o quebrar de uma já longa convenção política estabelecida, em que a força vencedora governa. Apesar da solução agora engendrada por António Costa não carecer de legitimidade formal e subverter, de certa forma, o processo democrático, carece de legitimidade substancial uma vez que não venceu as eleições, não devendo, a meu ver, derrubar um Governo minoritário da Coligação para instalar um Governo minoritário do PS, com um duvidoso acordo de incidência parlamentar, aparentemente apoiado pelos partidos à sua esquerda... 

A única via, tolerável pelo eleitorado, para Costa tentar “salvar a face”, seria a formação de um Governo unitário de esquerda, com PCP e Bloco responsabilizados pela governação, o que, no entanto, se afigura muito difícil pois, como bem notou António Barreto, na Grande Entrevista da RTP, em Portugal existem várias “esquerdas”, contraditórias entre si, semelhantes a duas linhas paralelas que nunca se tocam, e que muito dificilmente formariam um Governo estável, política e programaticamente.

A fim de obter essa propalada legitimidade substancial a esquerda ter-se-ia que unir em volta de um programa comum (qual novo Frentismo…) e obter, nas urnas, a maioria absoluta, dizendo ao que vem, em coligação pré-eleitoral, no que consubstanciaria uma mudança de regime, para uma bipolarização perfeita, onde um dos blocos obteria uma maioria estável de Governo ou, porventura, não. Com efeito, tal situação poderia configurar para o PS um possível esvaziamento eleitoral, tanto à sua esquerda como à sua direita, pois significaria uma inflexão ideológica que o encostaria à esquerda radical, afastando-o do seu espaço histórico natural, o centro. Para o PS poderia esta nova realidade redundar na sua “pasokização”, deixando-o fora da esfera governativa por longos anos - os eleitores tenderiam a preferir o original (BE) a uma cópia mal feita.

Para a Coligação restaria a dramatização constante, temperada por uma oposição responsável, recusando o seu assentimento às leis da “esquerda oportunista” (nas palavras de António Barreto, figura insuspeita da dita), deixando-a governar a seu bel-prazer, até que no seio desse Governo frentista se desse um inevitável choque, próprio de alianças contranatura.

É tudo uma questão de tempo até à convocação de eleições antecipadas pelo novo Presidente da República, onde, acredito, a Direita se baterá galhardamente por uma maioria absoluta, ocupando o espaço deixado em aberto pelo PS ao centro, permitindo-lhe continuar as reformas estruturais de que o país tanto carece, na sequência do processo de ajustamento desencadeado pela vinda da troica, ainda durante a vigência do Governo Sócrates.


Robert Neves

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Presidenciais brasileiras




Dilma Rousseff conquistou um segundo mandato no Palácio do Planalto, ainda que com uma votação substancialmente menor (51% dos votos válidos), relativamente há quatro anos atrás. Parece que programas como o Bolsa Família, aliás iniciados, ao contrário do que muitos pensam, ainda no consulado de Fernando Henrique Cardoso (FHC), e o apoio do seu mentor político, Luiz Inácio "Lula" da Silva foram suficientes para prolongar o ciclo do Partido dos Trabalhadores (PT) no poder, se bem que à tangente. De facto se fizermos uma análise mais cuidada, Dilma Rousseff é uma criação política de Lula, de quem se já cogita, aliás, poder concorrer já em 2018 ao cargo de Presidente, sendo patente que em termos de carisma e popularidade Dilma está a anos-luz do seu antecessor, apenas se mantendo à tona no espectro político brasileiro graças ao voto dos eleitores mais pobres, logo menos esclarecidos, do Norte e Nordeste brasileiro. Já Aécio Neves, o candidato "tucano", como são conhecidos os apoiantes do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), não resistiu à campanha negativa lançada pelas hostes "petistas" e a uma certa colagem aos "grandes interesses económicos", seja lá o que isso for, e a alegados casos de favorecimento familiar enquanto Governador de Minas-Gerais. De qualquer forma Aécio ganhou capital político nesta campanha que poderá utilizar na oposição ao Governo Dilma e, quiçá, numa eventual recandidatura ao Planalto. Sendo certo que Aécio tentou passar uma mensagem positiva de mudança no Brasil, a verdade é que a bipolarização entre PT e PSDB dura desde 1994 e não parece que vá mudar tão depressa. Quanto a Dilma, a sua missão neste segundo mandato, será ainda mais difícil pois além de uma maioria reduzida terá de lidar com um Congresso que é dos mais fragmentados do Mundo, com mais de trinta(!) formações políticas representadas e ainda mais conservador do que o anterior, dificultando e muito a urgentíssima reforma do sistema político brasileiro e o sempre premente combate à corrupção que grassa na sociedade brasileira, sendo igualmente transversal a todo o quadrante político...