quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Brasil acima de tudo, Deus acima de todos*

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Foi com este mote que Jair Messias Bolsonaro se tornou, no dia 28 de outubro, o 38º Presidente (eleito) da República Federativa do Brasil. Ao contrário da nossa realidade, no Brasil ainda está muito vincado um sentimento de pertença por parte da esmagadora maioria da população a diversas denominações e isso, naturalmente, transborda para a realidade política. Bolsonaro soube aproveitar este facto de forma muito arguta, personalizando ao máximo a eleição, simplificando-a e tornando-a uma escolha entre a “Redenção” (ele) e o “Apocalipse” (Haddad/PT/Lula), numa clássica tática de polarização (ou nós ou o caos). Em termos de estratégia política tem tudo para ser, de facto, um case study, se não veja-se o percurso que o candidato começou a delinear desde o dia em que foi esfaqueado (quando andava na faixa dos 20% dos votos) até ao dia da 2ª volta (ou 2º turno como dizem os nossos irmãos brasileiros), em que obteve a maioria absoluta dos votos (55%). Foi, sem margem para dúvidas, um percurso em ascendente, alicerçado numa mensagem simples (combate à insegurança e à corrupção e, por conseguinte, ao enriquecimento ilícito), plasmada aliás no título do artigo, num alvo bem definido (o PT e os seus 14 anos de governação) e na figura de um profeta-mártir (o mito Messias Bolsonaro).
Após o atentado de Minas Gerais houve, aliás, uma bem-sucedida moderação do discurso do candidato, aparecendo este com uma postura de humildade, quiçá até candura, e demonstrando uma fragilidade/humanidade até aí desconhecida e que terá apelado de forma decisiva a uma grande parte do eleitorado ainda indeciso. Foi, creio, o turning point de uma campanha de um candidato de franjas para uma campanha de um candidato com reais hipóteses de vencer não só a 1ª volta, como já se previa desde há algum tempo, mas também a 2ª volta, como veio efetivamente a suceder.
A partir desse momento, e estando em vantagem, foi uma questão de deixar o tempo correr, pois tornou-se evidente que o candidato do PT estava perante uma montanha impossível de escalar, o que explica a tentativa de Haddad forçar Bolsonaro a debater, fazendo-o sair da sua zona de conforto, o que este, ardilosamente, diga-se de passagem, evitou, pois estando em vantagem nada teria a ganhar em expor-se num campo onde o adversário seria previsivelmente mais forte. De ser um candidato incauto ninguém poderá acusar Bolsonaro, tendo seguido muito bem a velha máxima de esconder os defeitos e realçar as virtudes, como qualquer político que se digne deve fazer…
Não fugiremos à verdade se dissermos que o discurso de Bolsonaro tem alguns laivos populistas, embora com nuances  de um pragmatismo porventura inesperado, vindo de um candidato que se diz ser despreparado, como será a escolha de Paulo Guedes (reputado economista e seguidor da linha da Escola de Chicago) para Ministro das Finanças e Economia e, sobretudo, do Juiz Federal Sérgio Moro para Ministro da Justiça, numa notória e inusitada tentativa de marcar um claro contraste com a governação anterior, tentando introduzir um elemento “meritocrático” na escolha dos novos membros do Governo, o que é de salutar, note-se.
Relativamente às preocupações generalizadas quanto a possíveis pulsões ou derivas antidemocráticas do agora Presidente-eleito, nomeadamente à esquerda, com a colagem de epítetos como ditador ou fascista, basta atentar no discurso de Bolsonaro para perceber que, por agora, o novo Chefe de Estado brasileiro dá sinais de uma certa inversão de marcha e normalização/conformação aos trâmites democráticos vigentes, o que vem provar, mais uma vez, que as campanhas personalizadas como são as presidenciais, tendem sempre a extremar o discurso em período eleitoral para depois, naturalmente, moderarem os excessos de linguagem e discurso na fase pós-eleitoral. É dos livros, como diria o notável Norberto Bobbio. Teremos, pois, de aguardar pelas primeiras medidas do Governo Bolsonaro, concedendo-lhe o benefício da dúvida, como devemos fazer a todos aqueles que são eleitos democraticamente, sem exceção, antes de, antecipada e precipitadamente, nos convertermos em arautos da desgraça, mormente em relação a um candidato que prometeu governar “seguindo os mandamentos de Deus”.
Os desafios para o novo Governo não são de somenos, constituindo a gritante falta de segurança (um número impressionante de mais de 60.000 assassinatos só em 2017!) e a corrupção os problemas mais prementes para Bolsonaro e o seu elenco governativo tomarem em mãos, o que não será fácil, pois muitas dessas medidas terão de ter o crivo de um Congresso muito fragmentado (onde 30 partidos terão assento parlamentar na Câmara dos Deputados e 21 no Senado!), exigindo maiorias qualificadas para a aprovação de leis que estarão ainda sujeitas a litigância perante o Supremo Tribunal Federal, com poderes para avaliar a constitucionalidade dos actos normativos. Se juntarmos a isto a necessidade de um “choque” para revitalizar a anémica economia do Brasil, então estamos a falar de uma tarefa de proporções dantescas. Perante tal cenário, fica mais fácil entender o porquê de o novo Presidente recorrer constantemente à inspiração divina, é que bem vai precisar Dela!
Em jeito de conclusão, esperemos que esta mudança de ciclo possa, sinceramente, significar o alcançar dos anseios do povo desse país-continente, riquíssimo em recursos naturais e com condições para se assumir como uma grande potência regional, com um papel muito relevante a desempenhar no Grande Concerto das Nações.
Se Deus, como se sói dizer por Terras de Vera-Cruz, for mesmo brasileiro, então há razões para estarmos cautelosamente otimistas, pois pior do que estava não pode mesmo ficar, estamos em crer. Alea jacta est…

* Lema de campanha da candidatura à Presidência da República de Jair Bolsonaro   

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